Em 1944, durante a Segunda Guerra Mundial, o médico Henry Beecher enfrentou uma crise: escassez de morfina. Para aliviar a dor de soldados feridos, ele injetou soro fisiológico, dizendo ser um analgésico potente. Para sua surpresa, muitos relataram alívio imediato. Esse episódio, hoje clássico, revelou que uma mentira bem-intencionada pode ter efeitos reais! Mas até onde esse efeito pode ser confiável? Esse fenômeno, hoje amplamente estudado, ganhou um nome bem conhecido: <Efeito Placebo>
Placebo: Mais do que Imaginação
No livro Que Bobagem! (2023), Pasternak e Orsi – ainda na introdução – dedicam algumas páginas ao tema. Para eles, o placebo pode ser considerado um experimento natural: um mecanismo que expõe como crenças e contextos moldam a realidade biológica.
O experimento clássico dos cães de Pavlov ilustra bem esse mecanismo. Os animais, condicionados a associar uma sineta à comida, passaram a salivar só de ouvir o som – uma resposta fisiológica involuntária. Para Pasternak e Orsi, humanos funcionam sob a mesma lógica: ao tomar um comprimido repetidamente, o cérebro associa o ritual (o ato de engolir, o gosto do remédio) ao alívio. Troque a substância por açúcar, e o corpo ainda reagirá, liberando endorfinas ou modulando inflamações.
Placebo vs. Ciência: Uma Guerra Necessária
“Placebo não é tratamento, é efeito colateral da esperança”, alertam os autores. Eles criticam terapias alternativas que se escondem atrás desse fenômeno para vender falsas curas. A homeopatia, por exemplo, depende quase exclusivamente do placebo: suas bolinhas de açúcar (termo dos autores no livro) não têm princípios ativos, mas geram alívio subjetivo em parte dos pacientes.
Sobre esse ponto, um relatório de 2015 do National Health and Medical Research Council (Austrália) analisou 176 estudos e concluiu não haver evidências confiáveis de que a homeopatia funcione para além do efeito do placebo. “Se não faz bem, também não faz mal”, diriam alguns. Mas será que é inofensivo? A resposta é um sonoro Não. Por trás da aparente inocuidade, escondem-se riscos concretos:
- Engano sistêmico: Pacientes abandonam tratamentos comprovados (como quimioterapia) por confiarem em placebos.
Em 2018, um estudo do Journal of the National Cancer Institute revelou que pacientes com câncer que optaram por terapias alternativas em vez da medicina convencional tiveram risco de morte 2,5 vezes maior.
- Nocebo: Enquanto o placebo gera melhorias pela expectativa positiva, o nocebo age no sentido inverso, sintomas são exacerbados pela ansiedade ou crença negativa.
Por exemplo, em um estudo de 2007 publicado pela revista Neuroscience, pacientes que foram alertados sobre possíveis dores de cabeça após um tratamento placebo tiveram 44% mais relatos do efeito colateral, mesmo sem substância ativa no remédio.
A Fantasia que pode Ajudar (ou Atrapalhar)
Assim como crianças usam o “faz de conta” para dominar medos, adultos usam placebos para lidar com incertezas. Pasternak e Orsi destacam um estudo italiano publicado na Revista Pain (2001) com pacientes pós-cirúrgicos, onde:
- Grupo 1: Sabia que recebia soro fisiológico.
- Grupo 2: Não tinha certeza se era remédio ou placebo.
- Grupo 3: Acreditava receber um analgésico potente.
Resultado: O Grupo 3 pediu 50% menos remédios extras. A expectativa, não a substância, definiu o resultado. Mas os autores lembram: essa “fantasia” só é segura em dores leves. Para doenças graves, a ilusão vira armadilha.
O Médico como Condutor de Esperança

Se o placebo é tão poderoso, qual o papel do profissional de saúde? Pasternak e Orsi apontam: o médico deve ser um facilitador de contextos, não um manipulador. Isso significa:
- Transparência: Placebos só são éticos com consentimento e sem falsas promessas.
- Rituais que curam: A atenção empática, o ambiente acolhedor e a explicação detalhada dos tratamentos potencializam efeitos reais.
- Limites claros: No SUS, práticas como acupuntura são permitidas como complementos, nunca substitutos de evidências.
Conclusão: Para além do Estigma
O termo “Placebo” carrega um tom pejorativo — como se fosse sinônimo de fraude ou ingenuidade. Mas há valor nessa ilusão. Sempre houve! Imagine um xamã do século XII usando ervas inertes para acalmar tribos em pânico, ou um médico da Renascença receitando “pílulas de luz lunar” para aliviar a melancolia. Esses placebos históricos não curavam pestes ou a tuberculose, mas davam algo igualmente vital: esperança. E esperança, em dores leves ou crises existenciais, é um remédio legítimo.
O problema não está no placebo em si, mas na absolutização — seja dele ou até mesmo da ciência. Terapias alternativas como a homeopatia e a ‘cura quântica’ falham ao apresentar placebos como tratamentos eficazes, ignorando que seu efeito depende mais do contexto do que da substância. Por outro lado, a ciência também pode tropeçar quando se torna dogmática. Afinal, quantas vezes tratamentos antes considerados eficazes foram revistos décadas depois? Nós, humanos, precisamos de mais do que açúcar e ilusão… mas também de mais do que dados frios sem acolhimento. No fim, não se trata de escolher entre placebo e ciência, e sim de reconhecer que ambos atuam em dimensões diferentes da experiência humana.
Agora que você descobriu como o Efeito Placebo pode influenciar nossa percepção e até nossa biologia, que tal espalhar esse conhecimento? Compartilhe este texto com amigos, familiares e colegas para que possamos juntos promover um olhar mais crítico e informado sobre saúde e ciência.
Ótimo texto
Me ajudou tirar algumas dúvidas relacionadas à medicações homeopáticas.